As garantias no contrato de locação são instrumentos legais que protegem o proprietário contra inadimplência e danos ao imóvel.
No Brasil, a Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato) estabelece exatamente quatro modalidades permitidas: caução, fiança, seguro de fiança locatícia e cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.
Entender cada uma dessas garantias é fundamental para locadores e locatários tomarem decisões seguras e economicamente viáveis.
O que são garantias no contrato de locação?
Garantias no contrato de locação são mecanismos jurídicos que asseguram ao proprietário do imóvel o cumprimento das obrigações contratuais pelo inquilino. Funcionam como proteção patrimonial contra riscos como falta de pagamento de aluguéis, danos à propriedade, inadimplência de condomínio e IPTU, e descumprimento de cláusulas contratuais.
A natureza dessas garantias reside na assimetria de risco inerente à relação locatícia: o locador entrega um bem valioso, seu imóvel, a outra pessoa, confiando que os aluguéis serão pagos e o bem será devolvido em condições adequadas. As garantias existem para mitigar esse risco, oferecendo instrumentos concretos de execução caso o locatário descumpra suas obrigações.
Base legal das garantias no contrato de locação
O marco regulatório encontra-se no Artigo 37 da Lei 8.245/91, que lista taxativamente as quatro modalidades admitidas. Essa delimitação não é arbitrária — reflete escolha legislativa por equilibrar proteção ao locador com impedimento de exigências abusivas ao locatário.
O parágrafo único do Artigo 37 estabelece regra fundamental: é proibido exigir mais de uma garantia simultaneamente no mesmo contrato. A violação dessa vedação acarreta nulidade da garantia excedente e configura contravenção penal punível com prisão de cinco dias a seis meses ou multa.
Essa proibição de cumulação impede que o locador sobrecarregue o inquilino com múltiplas exigências que tornariam a locação economicamente inviável. Na prática, significa que o proprietário deve escolher estrategicamente qual modalidade melhor se adequa ao perfil do locatário e às características do imóvel.
Quais são as garantias permitidas no contrato de locação?
A Lei do Inquilinato estabelece quatro modalidades de garantias no contrato de locação, cada uma com características, vantagens e fundamentos jurídicos específicos. Compreender as particularidades de cada modalidade permite escolhas mais adequadas ao perfil da locação.
1. Caução
A caução representa garantia de natureza real – vincula um bem específico ao cumprimento das obrigações contratuais. Diferentemente das garantias pessoais (que se apoiam no patrimônio geral de alguém), a caução recai sobre bem determinado, conferindo ao locador preferência sobre aquele ativo.
1.1 Caução em dinheiro
Esta é a modalidade mais direta das garantias no contrato de locação com caução. O locatário deposita valor equivalente a até três meses de aluguel em caderneta de poupança autorizada pelo Poder Público. Esse limite legal é taxativo: cláusulas que estipulem depósito superior são nulas de pleno direito.
Durante a locação, o dinheiro rende juros e correção monetária que revertem ao locatário. Ao final do contrato, cumpridas todas as obrigações, o inquilino recupera o valor depositado acrescido dos rendimentos. O Artigo 38, §2º da Lei 8.245/91 determina que “a caução em dinheiro, que não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel, será depositada em caderneta de poupança […] revertendo em benefício do locatário todas as vantagens dela decorrentes”.
Vantagens da caução em dinheiro:
- Liquidez imediata para o locador em caso de inadimplência
- Retorno garantido e corrigido para o locatário
- Simplicidade operacional
- Não compromete terceiros
Desvantagens:
- Imobilização de capital significativo pelo locatário
- Valor limitado pode ser insuficiente em inadimplências prolongadas
- Rendimento da poupança frequentemente perde para a inflação
1.2 Caução em bens móveis
Essa modalidade de garantia no contrato de locação permite que o locatário ofereça veículos, máquinas, equipamentos ou títulos de crédito como garantia. A formalização exige registro em Cartório de Títulos e Documentos para produzir efeitos contra terceiros.
Tecnicamente, equivale a um penhor do bem móvel, tornando o locador credor preferencial sobre aquele ativo até a quitação das obrigações locatícias. O bem permanece na posse do locatário, mas com restrição de alienação sem anuência do locador.
1.3 Caução em bens imóveis
Entre as garantias no contrato de locação, a caução imobiliária é análoga à hipoteca. O locatário ou terceiro oferece um imóvel como lastro do contrato. A formalização requer averbação à margem da matrícula do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis, conferindo publicidade ao gravame.
O locador passa a deter direito real de garantia sobre o imóvel caucionado, podendo executá-lo judicialmente em caso de inadimplemento. Essa modalidade é mais comum em locações comerciais de alto valor ou quando o locatário possui múltiplos imóveis.
1.4 Caução em títulos e valores mobiliários
O Artigo 38, §3º da Lei 8.245/91 admite vinculação de ações, CDBs ou outros papéis como garantia. Estabelece proteção importante: se os títulos perderem liquidez por concordata, falência ou liquidação da empresa emitente, devem ser substituídos em 30 dias.
2. Fiança
A fiança locatícia representa a garantia pessoal mais tradicional entre as modalidades de garantias no contrato de locação. Disciplinada pelos Artigos 818 a 839 do Código Civil, nela um terceiro — o fiador — compromete-se a satisfazer as obrigações do locatário caso este não as cumpra.
Características fundamentais da fiança
Trata-se de contrato acessório, unilateral, gratuito e solene, que exige forma escrita e não admite interpretação extensiva. O fiador responde com todo seu patrimônio pessoal presente e futuro, ressalvados os bens legalmente impenhoráveis. Não há limite legal de valor — o fiador pode garantir contratos de qualquer montante.
Segundo o Artigo 818 do Código Civil, “pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor (locador) uma obrigação assumida pelo devedor (locatário), caso este não a cumpra”. Em locações, geralmente a fiança cobre todas as obrigações até a entrega das chaves, inclusive eventuais prorrogações.
Requisitos críticos da fiança locatícia
- Forma escrita obrigatória: a fiança só é válida por escrito, com assinatura do fiador. Não se admite presunção nem interpretação extensiva de seus termos (Código Civil, art. 819).
- Outorga conjugal: quando o fiador for casado em regime de comunhão de bens, é obrigatória a autorização expressa do cônjuge. O Código Civil, Artigo 1.647, III, exige outorga conjugal para prestação de fiança (exceto no regime de separação absoluta de bens). A Súmula 332 do STJ consolidou que a ausência dessa autorização implica ineficácia total da garantia.
- Responsabilidade solidária: embora em regra o fiador responda subsidiariamente, os contratos locatícios geralmente preveem cláusula de solidariedade, permitindo ao locador acionar diretamente o fiador tão logo haja inadimplência.
Duração e exoneração do fiador
Pela redação atual do Artigo 39 da Lei 8.245/91, a fiança permanece vigente até a efetiva devolução do imóvel, ainda que o contrato se prorrogue por prazo indeterminado. O fiador pode, porém, notificar sua intenção de se exonerar, permanecendo responsável por 120 dias após a notificação — findo esse prazo, libera-se das obrigações futuras.
Bem de família: uma questão crítica
A questão mais delicada entre as garantias no contrato de locação com fiança reside na penhorabilidade do bem de família do fiador. O Artigo 3º, VII, da Lei 8.009/90 permite expressamente a penhora do único imóvel residencial do fiador para satisfação de dívidas locatícias.
O STF pacificou a questão no Tema 1.127 (2022), declarando constitucional essa penhora tanto em locações residenciais quanto comerciais. O fundamento é que a possibilidade de penhora incentiva proprietários a disponibilizarem imóveis para locação, ampliando a oferta habitacional.
Essa realidade torna a fiança modalidade de risco elevado para o fiador, explicando a crescente dificuldade de locatários encontrarem pessoas dispostas a assumir tal responsabilidade. Dados de mercado mostram que a participação do fiador caiu de 62% em 2020 para 39,45% em 2024.
3. Seguro de fiança locatícia
O seguro de fiança locatícia representa a profissionalização das garantias no contrato de locação. Introduzido pela Lei 8.245/91, nessa modalidade uma seguradora autorizada pela SUSEP assume a responsabilidade de indenizar o locador pelos prejuízos decorrentes de inadimplemento do locatário.
Estrutura jurídica do seguro fiança
Diferentemente da fiança pessoal, aqui existe contrato de seguro entre três partes: o locatário (tomador/garantido) contrata a apólice e paga o prêmio à seguradora, enquanto o locador figura como segurado/beneficiário. Em caso de inadimplência, a seguradora paga o locador e depois exerce direito de regresso contra o locatário.
Coberturas do seguro de fiança locatícia
As coberturas são regulamentadas pela SUSEP, atualmente pela Circular 671/2022. A cobertura básica obrigatória abrange o inadimplemento de aluguéis. Coberturas adicionais podem incluir:
- Condomínio e IPTU em atraso
- Contas de água, luz e gás
- Danos físicos ao imóvel
- Multas contratuais
- Honorários advocatícios
O Artigo 41 da Lei do Inquilinato determina que o seguro deve abranger a totalidade das obrigações do locatário, dentro dos limites da apólice contratada.
Custos e análise de risco
As seguradoras avaliam renda, histórico de crédito, tempo de emprego e outros fatores para precificar o prêmio, que geralmente equivale a um ou dois aluguéis anuais. Esse valor não é recuperável pelo locatário – diferentemente da caução, onde o dinheiro retorna corrigido ao final.
Vantagens do seguro fiança:
- Dispensa buscar fiador
- Não compromete terceiros
- Execução simplificada para o locador
- Aprovação geralmente rápida
Desvantagens:
- Custo adicional não reembolsável
- Locatários com restrições cadastrais podem ter dificuldades na aprovação
- Necessidade de renovação em prorrogações contratuais
4. Cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento
A cessão fiduciária constitui a modalidade mais recente entre as garantias no contrato de locação, incluída pela Lei 11.196/2005. Trata-se de garantia real de natureza fiduciária, em que o locatário vincula ativos financeiros (quotas de fundo de investimento) em favor do locador.
Como funciona a cessão fiduciária
Na estrutura fiduciária, o locatário permanece formalmente como cotista do fundo, mas os direitos sobre as quotas são cedidos ao locador até a extinção da garantia. As quotas ficam bloqueadas — o locatário não pode resgatá-las ou movimentá-las livremente durante a locação.
Em caso de inadimplência, o locador pode exigir a venda ou resgate das quotas para abater o débito, tendo preferência sobre eventuais credores do locatário. Cumpridas as obrigações, o locatário recupera as quotas valorizadas.
Formalização da cessão fiduciária
A formalização exige termo de cessão fiduciária (geralmente anexo ao contrato de locação) especificando as quotas dadas em garantia. É necessário notificar a administradora do fundo para que registre a restrição na conta do cotista e impeça qualquer resgate sem autorização do locador.
Diferenciais desta garantia
Entre as garantias no contrato de locação, a cessão fiduciária apresenta características únicas:
- Sem limite legal de valor: Diferentemente da caução em dinheiro, as partes podem acordar montante que julgarem adequado, geralmente entre seis e doze meses de aluguel
- Manutenção de rendimentos: O capital permanece como patrimônio do locatário, rendendo juros ou correção durante a locação
- Execução facilitada: Fundos de investimento permitem resgate relativamente rápido
- Devolução valorizada: Ao final do contrato, o locatário recupera as quotas com valorização
Por que a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento é pouco utilizada?
Apesar das vantagens técnicas, essa modalidade permanece subutilizada principalmente porque exige que o locatário já possua recursos financeiros investidos ou disponíveis para tal finalidade. A necessidade de possuir quotas em fundos específicos com valor inicial significativo (frequentemente entre seis e doze aluguéis) limita sua aplicação prática.
Como escolher a melhor garantia no contrato de locação?
A escolha entre as garantias no contrato de locação envolve ponderação de múltiplos fatores relacionados ao perfil financeiro do locatário, valor do imóvel, prazo da locação, custos envolvidos e riscos aceitáveis para cada parte.
Critérios para locadores
Para imóveis residenciais de médio valor:
- Seguro fiança oferece segurança sem necessidade de acionar terceiros
- Caução em dinheiro garante liquidez imediata mas com valor limitado
Para imóveis comerciais ou de alto valor:
- Fiança com fiador de alto patrimônio oferece garantia robusta
- Caução imobiliária ou cessão fiduciária proporcionam lastro mais substancial
Para locações de curto prazo:
- Caução em dinheiro oferece simplicidade operacional
- Seguro fiança evita custos de formalização de garantias mais complexas
Critérios para locatários
Locatário com liquidez mas sem fiador:
- Caução em dinheiro (até 3 aluguéis) é opção viável
- Seguro fiança dispensa imobilização de capital alto
Locatário com fiador disponível:
- Fiança não implica desembolso imediato
- Atenção aos riscos do fiador (penhorabilidade do bem de família)
Locatário com investimentos financeiros:
- Cessão fiduciária mantém rendimentos durante a locação
- Valor investido retorna valorizado ao final
Locatário sem recursos nem fiador:
- Seguro fiança geralmente é a única opção viável
- Análise de crédito pode aprovar mesmo sem alto patrimônio
Aspectos legais das garantias no contrato de locação
1. Proibição de cumulação de garantias
A regra mais importante sobre garantias no contrato de locação está no parágrafo único do Artigo 37 da Lei 8.245/91: é vedado exigir mais de uma modalidade simultaneamente. A violação acarreta:
- Nulidade da garantia excedente
- Contravenção penal punível com prisão de 5 dias a 6 meses ou multa
- Prevalência da primeira garantia prestada (jurisprudência do STJ)
2. Extensão temporal das garantias
O Artigo 39 da Lei 8.245/91, alterado pela Lei 12.112/2009, estabelece que qualquer garantia se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que a locação se prorrogue por prazo indeterminado. Essa regra protege o locador em contratos que se renovam automaticamente.
3. Substituição de garantias
O Artigo 40 da Lei do Inquilinato lista situações em que o locador pode exigir que o locatário apresente nova garantia em 30 dias:
- Morte do fiador
- Falência ou insolvência do fiador
- Alienação de todos os bens do fiador
- Mudança de endereço não informada
- Perda de liquidez de títulos caucionados
4. Contratos sem garantia
Quando nenhuma garantia no contrato de locação é estabelecida, o Artigo 42 autoriza o locador a exigir pagamento do aluguel até o 6º dia útil do mês vincendo — ou seja, pagamento antecipado. Adicionalmente, a Lei 12.112/2009 criou possibilidade de despejo liminar em 15 dias em caso de inadimplência.
As garantias permitidas pela Lei 8.245/91 são: caução (em dinheiro, bens móveis, imóveis ou títulos), fiança locatícia, seguro de fiança locatícia e cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento. Cada modalidade tem características e custos específicos
Não. A Lei do Inquilinato proíbe expressamente a exigência de mais de uma garantia simultaneamente no mesmo contrato. A cláusula que exigir dupla garantia é nula e pode configurar contravenção penal punível com prisão ou multa.
Conclusão
As garantias no contrato de locação representam instrumento essencial de equilíbrio entre os interesses do locador e do locatário. O sistema brasileiro, ao delimitar taxativamente quatro modalidades e proibir sua cumulação, busca impedir abusos contra inquilinos ao mesmo tempo em que oferece proteção efetiva aos proprietários.
A escolha estratégica da garantia adequada envolve compreensão aprofundada de cada modalidade:
- Caução oferece liquidez mas exige desembolso inicial
- Fiança não tem custo direto mas expõe terceiros a riscos patrimoniais graves
- Seguro fiança profissionaliza a relação mas implica custo não recuperável
- Cessão fiduciária combina vantagens técnicas com baixa utilização prática
Para departamentos jurídicos de empresas que gerenciam carteiras imobiliárias, a padronização de garantias e o acompanhamento de sua validade durante a locação constituem práticas essenciais de gestão de risco. A substituição tempestiva de garantias que se tornaram inadequadas e o controle de prazos de exoneração de fiadores evitam exposições não intencionais.
O conhecimento aprofundado das garantias no contrato de locação, seus fundamentos legais e suas implicações práticas permite celebrar contratos equilibrados, juridicamente sólidos e economicamente viáveis para ambas as partes, objetivo último da regulamentação locatícia no ordenamento brasileiro.
A tendência de mercado aponta inequivocamente para profissionalização crescente, com declínio do favor pessoal (fiança tradicional) e ascensão de produtos financeiros estruturados. Compreender essa dinâmica e adaptar-se às novas modalidades de garantias no contrato de locação será fundamental para proprietários, inquilinos e profissionais do mercado imobiliário nos próximos anos.
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