Prescrição intercorrente no Novo CPC: Conceito e condições

27/08/2020
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20/06/2023
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13 minutos

A prescrição intercorrente tem como objetivo garantir a celeridade do processo judicial e a terminação do mesmo em tempo razoável, conforme apresentam os princípios apontados na Constituição Federal brasileira.

A celeridade e o prazo razoável para a finalização de disputas judiciais são princípios constitucionais do nosso ordenamento jurídico. O instituto da prescrição intercorrente, portanto, tem como finalidade garantir que não haverá inércia do autor de uma ação no momento da execução judicial da mesma.

Dessa forma, a prescrição intercorrente tem como objetivo punir o autor de uma demanda que se torna inerte no momento de cumprir a execução judicial e resgatar os seus créditos do executado, estipulando um prazo para que a ação seja feita, sob pena do autor perder o seu direito de pedir o ressarcimento por via judicial.

Este artigo tem como objetivo esclarecer o que é a prescrição intercorrente, como ela funciona e como são seus regramentos dentro do âmbito civil, trabalhista e na execução fiscal. Continue lendo abaixo!

O que é prescrição intercorrente?

A prescrição intercorrente é o termo utilizado para descrever a situação onde a parte autora de uma ação perde o direito de exigir judicialmente algum direito subjetivo por conta de sua inércia durante o decorrer do processo, mais especificamente no momento da execução do mesmo.

O instituto da prescrição intercorrente existe com o objetivo de efetivar o princípio constitucional da razoável duração do processo judicial e administrativo, postulado no artigo 5º da Carta Magna brasileira:

“LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

Dessa forma, a prescrição intercorrente visa impossibilitar que execuções judiciais ocorram por prazo indefinido, uma vez que extingue o direito da parte autora da lide de reivindicar seu direito caso não o consiga após determinado tempo.

Dentro do âmbito jurídico brasileiro, é necessário que ambas as partes de um processo tenham interesse na sua resolução para que ele ocorra da forma mais célere possível.

Se a parte autora da demanda, teoricamente a mais interessada em ter seu direito subjetivo efetivado, não demonstrar interesse na resolução do conflito, não atuando para a resolução da demanda, a prescrição intercorrente pode ser invocada pela outra parte, demonstrando o desinteresse do autor em resolver o processo.

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Como é tratado o instituto da prescrição intercorrente no âmbito civil

A fim de entender melhor o que constitui o instituto da prescrição intercorrente, é necessário analisar seu histórico. 

O CC de 1919 e o CPC de 1973, não mencionavam a possibilidade de aplicação da prescrição intercorrente, até a entrada do Código de Processo Civil no ano de 2015.  Antes, era rodeado de incertezas, insegurança jurídica e por conta disso, não era sequer mencionada a possibilidade de o direito ser extinto por inércia do seu titular.

Com o Novo Código de Processo Civil, em 2015, houve uma verdadeira mudança referente à essa modalidade de prescrição. O NCPC se mantém omisso quanto a possibilidade de prescrição intercorrente no curso de um processo de conhecimento. Ou seja, sua aplicação é clara e explícita na parte que dispõe da suspensão e extinção de execução.

Cabe lembrar, que o processo se tornou sincrético a partir da promulgação da Lei 11.232/05, ou seja, a fase executiva passou a ser realizada dentro do mesmo processo de conhecimento.

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O que difere a prescrição da prescrição intercorrente?

A partir das afirmações expostas acima, é possível compreender que a prescrição intercorrente, tal qual a prescrição, configura a perda de um direito a partir da perda de um prazo para exercê-lo. Entretanto, os dois institutos se diferem.

Para mostrar a diferença jurídica entre os dois termos, utilizaremos um exemplo: Jonas vende uma motocicleta para Luana pelo valor de R$ 10 mil, porém Luana não o paga o valor da forma estabelecida pelos dois.

No momento em que Luana não realiza o pagamento do bem, ela está ferindo um direito de Jonas e, com isso, abre uma pretensão legal para que o mesmo utilize a via judicial para cobrar dela o valor da motocicleta.

Entretanto, para manter a segurança jurídica, essa pretensão de Jonas não existe para sempre. Ele precisa ingressar com a ação de cobrança em tempo estabelecido por lei, sob a pena de prescrição do direito de cobrar Luana judicialmente.

Dessa forma, a prescrição é a extinção do direito de uma pessoa cobrar judicialmente outra por algum tipo de violação dos seus direitos a partir da perda do prazo estabelecido por lei para realizar tal ato.

Agora, reutilizaremos o exemplo de Jonas e Luana para exemplificar a prescrição intercorrente. Dessa vez, Jonas entrou com ação judicial em prazo tempestivo. A ação ocorreu normalmente e chegou no momento da execução ou cumprimento da sentença proferida pelo juiz.

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Entretanto, no momento da execução da sentença, Jonas não encontrou bens no nome de Luana (e nem a motocicleta) para penhorar no valor da causa. Isso fez com que a sentença não cumprisse a sua função judicial, uma vez que a dívida não foi paga.

Assim sendo, o direito processual civil possibilita que a execução seja postergada, para que os efeitos da mesma ocorram no futuro, sem que o prazo prescricional continue andando. Caso não seja possível resolver a execução, ocorre a prescrição intercorrente.

A prescrição intercorrente, portanto, também é a perda do direito da parte de requerer algum direito judicialmente, mas não pela perda do prazo para entrar com a ação, mas pela demora no cumprimento da sentença ou execução imposta pelo juiz.

Prescrição intercorrente no Novo CPC: o que diz o artigo 921?

A prescrição intercorrente está prevista no Código de Processo Civil de 2015 (Novo CPC) em seu artigo 921, especificamente no seu inciso III, como uma das previsões de suspensão da execução judicial.

“Art. 921. Suspende-se a execução:

III – quando o executado não possuir bens penhoráveis”.

Assim sendo, pode-se afirmar que dentro do processo civil, a prescrição intercorrente só ocorre no período de execução judicial, na situação onde o executado não apresenta bens penhoráveis para que seja realizado o pagamento ao credor.

O próprio artigo 921 do Novo CPC apresenta cinco parágrafos que apresentam os regramentos de como se prossegue a execução judicial após a sua suspensão no que consta o inciso III.

§ 1º Na hipótese do inciso III, o juiz suspenderá a execução pelo prazo de 1 (um) ano, durante o qual se suspenderá a prescrição.

§ 2º Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano sem que seja localizado o executado ou que sejam encontrados bens penhoráveis, o juiz ordenará o arquivamento dos autos.

§ 3º Os autos serão desarquivados para prosseguimento da execução se a qualquer tempo forem encontrados bens penhoráveis.

§ 4º Decorrido o prazo de que trata o § 1º sem manifestação do exequente, começa a correr o prazo de prescrição intercorrente.

§ 5º O juiz, depois de ouvidas as partes, no prazo de 15 (quinze) dias, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição de que trata o § 4º e extinguir o processo.”

Sendo assim, no momento da execução judicial, caso não sejam encontrados bens no nome do devedor (uma situação bastante comum dentro do ordenamento jurídico brasileiro), suspende-se a execução durante um ano, prazo onde a prescrição da ação também é suspenso.

Depois deste um ano, caso não sejam achados bens no nome do devedor ou não seja encontrado o próprio devedor, o juiz arquivará os autos, dando início à contagem do prazo de prescrição intercorrente, que será igual ao prazo prescricional comum da ação.

Por exemplo: no nosso exemplo anterior, Jonas teria, de acordo com o Código Civil, o prazo de cinco anos para entrar com a ação cobrando o valor de Luana pela motocicleta.

Se ele entrar com a ação, ela ocorrer normalmente e, no momento da execução, não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz decretará a suspensão da execução por um ano.

Após este um ano, caso não tenham sido encontrados bens penhoráveis de Luana ou a própria Luana, o juiz arquivará os autos do processo, começando a contagem do prazo prescricional.

Dessa forma, Jonas terá cinco anos novamente para encontrar bens penhoráveis da parte. Se após os cinco anos nada se movimentar, o juiz aplicará o parágrafo 5º do artigo 921, pedindo a manifestação das partes e, caso nada ocorra sobre a execução, extinguirá o processo.

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Prescrição intercorrente na Lei de Execução Fiscal

A lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, conhecida como a Lei de Execução Fiscal, apresentou a prescrição intercorrente pela primeira vez de forma formal na legislação brasileira, sendo os regramentos estabelecidos no Novo CPC praticamente uma cópia dos mostrados pela lei.

Dentro da execução fiscal, onde a Fazenda Pública executa judicialmente um devedor para reaver valores devidos ao Poder Público, há a previsão, dentro da lei específica, para que ocorra a prescrição intercorrente.

O artigo 40 da Lei de Execução Fiscal, tal qual o Novo CPC, apresenta a possibilidade de suspensão da execução por um ano, seguido da contagem nova do prazo de prescrição intercorrente.

Art. 40 – O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

§ 1º – Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública.

§ 2º – Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos.

§ 3º – Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução.

§ 4º – Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.

§ 5º – A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4o deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda.”

As similaridades entre o texto da lei específica de 1980 e o do Novo CPC a respeito do tema são bem claras, mostrando como o regramento utilizado no processo civil brasileiro atualmente foi inspirado na lei 6.830/80.

Há prescrição intercorrente no Direito do Trabalho?

A prescrição intercorrente no Direito do Trabalho foi um assunto de discussão entre órgãos máximos do Poder Judiciário por anos, com o Supremo Tribunal Federal advogando pela aplicação da prescrição intercorrente (súmula 327) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) afirmando que não se aplicava o instituto (súmula 114).

Com a reforma trabalhista, criada a partir da lei nº 13.467/17, a Consolidação das Leis do Trabalho sofreu mudanças significativas, incluindo, em seu texto, a possibilidade de prescrição intercorrente:

Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos.

§ 1º A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução.

§ 2º A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.”

Dessa forma, a nova legislação pacificou que a prescrição intercorrente pode ocorrer no direito trabalhista também, a partir da inércia do exequente em cumprir a determinação judicial apresentada na execução após dois anos.

Leia também:

Prazos da prescrição intercorrente

A prescrição intercorrente não possui um prazo específico para ocorrer, uma vez que o seu prazo é igual ao prazo prescricional comum para que a parte torne a pretensão de direito em uma ação judicial formal.

Essa matéria foi pacificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a partir da Súmula 150, que regra:

“Como assentado na decisão agravada, o Tribunal a quo decidiu em harmonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que assentou que a execução prescreve no mesmo prazo prescricional da ação (Súmula 150 deste Supremo Tribunal). Nesse sentido: (…) (ACO 408-AgR, Relator Ministro Marco Aurélio, Plenário, DJ 27.6.2003). (…) Concluir de forma diversa do que decidido pelas instâncias originárias demandaria a análise de legislação infraconstitucional (Lei 4.717/1965).”

[ARE 732.027 AgR, rel. min. Cármen Lúcia, 2ª T, j. 7-5-2013, DJ de 10-6-2013.]”

Sendo assim, dentro do ordenamento jurídico civil, os prazos processuais das demandas específicas devem ser visualizadas a partir do que regra os artigos 205 e 206 do Código Civil:

“Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.”

O artigo 206 do Código Civil, por sua vez, estipula exemplos de situações onde a prescrição pode ocorrer num prazo entre um e cinco anos, dependendo da situação específica.

Perguntas frequentes sobre prescrição intercorrente

O que é prescrição intercorrente?

A prescrição intercorrente é o termo utilizado para descrever a situação onde a parte autora de uma ação perde o direito de exigir judicialmente algum direito subjetivo por conta de sua inércia durante o decorrer do processo, mais especificamente no momento da execução do mesmo.

O que difere a prescrição da prescrição intercorrente?

A prescrição é a extinção do direito de uma pessoa cobrar judicialmente outra por algum tipo de violação dos seus direitos a partir da perda do prazo estabelecido por lei para realizar tal ato.
A prescrição intercorrente, portanto, também é a perda do direito da parte de requerer algum direito judicialmente, mas não pela perda do prazo para entrar com a ação, mas pela demora no cumprimento da sentença ou execução imposta pelo juiz.

Qual o prazo da prescrição intercorrente?

No processo trabalhista, a prescrição intercorrente acontece em dois anos e inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução.

Quais os pressupostos da prescrição intercorrente?

No processo civil, os pressupostos para ocorrer a prescrição intercorrente são: existência de um processo de execução; não localização de bens penhoráveis; suspensão da execução pelo prazo de 1 ano; transcurso do prazo para dar início à contagem da prescrição.

Conclusão

A prescrição intercorrente tem como objetivo garantir a celeridade do processo judicial e a terminação do mesmo em tempo razoável, conforme apresentam os princípios apontados na Constituição Federal brasileira.

Dessa forma, o instituto procura impedir, no âmbito civil, trabalhista e fiscal, a cobrança por tempo indeterminado de uma execução, forçando o autor a não se manter em inércia dentro do processo, sob a pena de perder o direito de reivindicar o direito inicialmente proposto na demanda.

Mesmo tendo praticamente copiado o texto da Lei de Execução Fiscal, o legislador inovou ao apresentar a prescrição intercorrente no Novo CPC, uma vez que o instituto não era claramente representado dentro do direito processual civil antes de sua aparição no CPC de 2015.

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Autor: Tiago Fachini

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  • Especialista em Marketing Jurídico
  • Palestrante, professor e um apaixonado por um mundo jurídico cada vez mais inteligente e eficiente.

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  1. o reu foi condenado a pena de 4.a 11m. em janeiro de 2015, por crime cometido em dezembro de 2012. respondendo em liberdade e ate agora não foi preso. Prescreveu o direito do estado em cumprir a pena e prende-lo