Extinção da punibilidade: como funciona na ordem tributária?

12/12/2018
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15/05/2023
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9 minutos

O Estado detém monopólio da violência. Desse modo, a ele é concedido o poder de aplicar sanções àqueles que violem as normas jurídicas. Contudo, o próprio Direito prevê limites a esse poder. E, em algumas hipóteses, retira-o. É o caso, por exemplo da extinção da punibilidade.

Bastante conhecida no âmbito do Direito Penal, a extinção da punibilidade também incide sobre os crimes de ordem tributária. Aqui, então, abordam-se as particularidades dessa extinção.

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Conceito de Extinção da Punibilidade

O poder punitivo é uma das prerrogativas do Estado. É este, então, o denominado jus puniendi. Ou seja, ao Estado é concedido o poder de aplicar uma norma ao caso concreto – processo de subsunção da lei – de modo a implicar em uma sanção ao autor imputável do fato típico e ilícito.

No entanto, o poder de punir não é ilimitado. Ao mesmo tempo em que o próprio ordenamento jurídico prevê o direito do Estado de aplicar sanções contra aqueles que transgridam suas normas, ele também prevê limites à capacidade de punição estatal. A extinção da punibilidade, portanto, é a perda desse direito.

Nesses casos, o processo será extinto, e a primariedade do réu será mantida.

Causas de extinção da punibilidade no Código Penal

Como vislumbrado, o Estado perde o direito de prosseguir com a ação punitiva em determinados casos. Em geral, as causas atingem apenas o direito de punição. Não atingem, portanto, o delito em si. Contudo, há causas específicas de extinção da punibilidade em que o objeto atacado não é o direito de punição, mas o fato que enseja a sanção. É o caso, por exemplo, da anistia e da abolitio criminis.

O artigo 107 do Código Penal, assim, prevê as causas genéricas de extinção da punibilidade, embora haja outras no ordenamento jurídico brasileiro, como é o caso da suspensão condicional do processo.

Rol exemplificativo do artigo 107 do Código Penal

Desse modo, é rol exemplificativo da extinção de punibilidade no artigo:

 Art. 107 – Extingue-se a punibilidade:

  1. pela morte do agente;
  2. anistia, graça ou indulto;
  3. pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
  4. pela prescrição, decadência ou perempção;
  5. renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;
  6. pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;
  7. (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
  8. (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
  9. pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.

Os incisos VII e VII do artigo 107, CP, como se percebe, foram revogados em 2005. Isto porque previam o perdão para crimes contra a dignidade sexual (até a época chamados de crimes contra os costumes) em face do casamento da vítima com ao autor do fato.

Morte do agente

O inciso I do artigo 107, CP, prevê que a extinção da punibilidade pela morte do agente. Isto se explica na medida em que a pena é personalíssima. Ou seja, não se pode imputar, em regra, a terceiro a pena por conduta de outrem. Isto, contudo, não se aplica aos efeitos civis da pena, tais como os deveres de indenização.

Ocorre que havia uma lacuna na lei. Nos casos em que o agente forjasse a própria morte para evadir-se do pagamento tributário e da condenação, a extinção da punibilidade seria revogada?

Para tanto, seria preciso desconstituir a coisa julgada por meio de Revisão Criminal. No entanto, as hipóteses de Revisão são para sentenças condenatórias. E o que há é justamente uma sentença que extingue a condenação.

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O Supremo Tribunal Federal, todavia, entende que a sentença que extingue a punibilidade com base em atestado de óbito falso não faz coisa julgada material. Observa-se o acórdão

3) É entendimento jurisprudencial que a decisão que declara extinta a punibilidade da espécie, fundada em atestado de óbito falso, não faz coisa julgada material.

(HC 143.474/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 06/05/2010, DJe 24/05/2010)

Prescrição e Perdão judicial

A prescrição no âmbito do Direito Penal faz referência à perda da pretensão punitiva do Estado por decorrência do tempo. Desse modo, se o Estado não promover ação penal de origem tributária, poderá ser declarada a extinção da punibilidade.

Enquanto a prescrição se refere a uma conduta omissiva, ou seja, o Estado deixa de promover o processo, o perdão judicial trata de uma conduta ativa. Mesmo após o reconhecimento dos elementos do delito capazes de promover a condenação, o juízo concede o perdão. Claramente, a concessão do perdão judicial deve preencher requisitos legais.

Crimes contra a ordem tributária

O Direito Tributário é um ramo do Direito Público que regula a relação entre o Estado e o contribuinte. Este último, ainda, pode ser tanto uma pessoa física quanto uma pessoa jurídica.

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Embora alguns crimes possam ser cometidos contra a ordem tributária, nem todos estão previstos no Código Penal.  Apenas dois ilícitos tributários encontram-se tipificado no Código Penal, quais sejam os artigos 168-A e 337-A.

Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional […]

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem deixar de:

  1. recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;
  2. recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;
  3.  pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.

Art. 337-A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

  1. omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário, trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem serviços;
  2. deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços;
  3. omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias.

Para análise da extinção da punibilidade na ordem tributária, portanto, é necessário analisar quais seriam os crimes da Lei nº 8.137/1990.

Crimes contra a ordem tributária na Lei nº 8.137/1990

De fato, a lei que define os crimes contra a ordem tributária é a Lei nº 8.137/1990. Assim, constituem crimes dessa espécie, segundo os artigos 1º e 2º da lei:

  • suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante:
    • omissão de informação ou prestação de declaração falsa às autoridades fazendárias;
    • fraude à fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
    • falsificação ou alteração de nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;
    • elaboração, distribuição, fornecimento, emissão ou utilização de documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;
    • negação ou omissão no fornecimento, quando obrigatório, de nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação;
  • fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;
  • deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
  • exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal;
  • deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;
  • utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

Causas de extinção da punibilidade na ordem tributária

Quanto às causas de extinção da punibilidade previstas no Código Penal, estas também se aplicam aos crimes tributários.

Extinção pelo pagamento

A Lei nº 9.249/1995 previa, em seu artigo 34, a extinção da punibilidade na ordem tributária quando o agente promovesse “o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia”. No entanto, este foi um tema que demorou a ser pacificado em função das constantes alterações legislativas.

Em 2003, então, foi editada a Lei nº 10.684. A nova legislação dispunha acerca do parcelamento do débito tributário e previa também hipóteses de extinção da punibilidade.

O grande questionamento em torno dele se referia à abrangência de sua previsão. Pela redação do seu artigo 9º, a pretensão punitiva do Estado era suspensa durante o parcelamento do débito. Desse modo, não era alcançado pelo prazo prescricional. No entanto, ocorria extinção da punibilidade quando o agente pagasse integralmente os débitos oriundos de tributos e contribuições sociais.

Deixava, portanto, de especificar se o pagamento era causa da extinção da punibilidade apenas antes da denúncia ou mesmo após. Consequentemente, alguns juristas passaram a interpretar no sentido de que se aplicava a qualquer momento do pagamento.

Em 2011, por fim, alterou-se o § 4º do artigo 83 da Lei 9.430/1990, que passou a dispor ser possível a extinção pelo pagamento a qualquer tempo. Assim, é a sua redação:

§ 4o  Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento.

O entendimento do Supremo Tribunal Federal pende para a compreensão de que o pagamento gera extinção da punibilidade feito a qualquer momento, exceto nos casos de parcelamento. Nestes, então, somente ocorrerá a extinção da punibilidade quando realizado integralmente antes da denúncia.

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