Improbidade Administrativa: regras gerais e o que diz a nova lei

06/10/2020
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17/04/2024
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24 minutos

A lei de improbidade administrativa é um marco significativo para o combate da corrupção sistemática entre o Poder Público e as entidades privadas.

E, em 2021, foi aprovada a nova lei de improbidade administrativa (Lei 14.230/21). Por meio dela, são alteradas algumas disposições presentes na lei vigente até então (Lei 8.429/92).  

Em resumo, ambos os textos legais contribuem para promover o respeito ao interesse público que os cargos demandam. Bem como, servem para definir as punições cabíveis a quaisquer atos de improbidade administrativa. 

Neste artigo, você verá, primeiro, o que é a improbidade administrativa e quais condutas são consideradas atos de improbidade. 

Depois, conhecerá as legislações específicas, assim como as definições e punições ali previstas. Por fim, verá ainda como atuam os advogados, em ações de improbidade administrativa. Boa leitura!

O que é improbidade administrativa

A improbidade administrativa é todo o ato realizado por agente público que fira os princípios fundamentais da Administração Pública, sendo esses a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência.

Os princípios que regem a Administração Pública brasileira estão previstos na Constituição Federal de 1988, especificamente no artigo 37 do texto, que traz:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”

A improbidade administrativa, que pode ser traduzida como a desonestidade daquele que exerce função na Administração Pública, também possui previsão constituição para sua punição, dentro do próprio artigo 37, em seu parágrafo 4º.

“§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

Por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, há a necessidade de uma lei específica que apresente como será definida a improbidade administrativa e quais são as punições previstas para tais atos.

A primeira lei a tratar da matéria, após a promulgação da Constituição, é a lei nº 8.429/92, conhecida como a Lei de Improbidade Administrativa (LIA).

Posteriormente, a LIA, seria alterada pela Lei 14.230/21. Pela quantidade e profundidade das modificações que promoveu, essa legislação ficou conhecida como Nova Lei de Improbidade Administrativa

A seguir, você conhecerá as principais contribuições trazidas por cada uma dessas legislações. Mas, antes de prosseguir, vamos entender o que a lei classifica como “agente público”.

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Lei de Improbidade Administrativa (LIA)

Como qualquer outra norma constitucional de eficácia limitada, o parágrafo 4º do artigo 37 da Carta Maior brasileira dependia da criação de uma legislação que amparasse e desses regramentos para situações de improbidade administrativa.

No dia 2 de junho de 1922, o então presidente Fernando Collor sancionou a Lei 8.429, que ficou conhecida como a Lei de Improbidade Administrativa (LIA) ou Lei do Colarinho Branco, que definia os atos e punições àqueles que exercessem seus cargos públicos com má-fé.

A razão da existência da Lei de Improbidade Administrativa se dá pelo princípio de que todo o agente público deve trabalhar na Administração Pública com boa-fé e honestidade, procurando atender ao interesse público, e não a interesses próprios ou escusos.

Dessa forma, a lei procura punir não só aquele que utiliza de seu cargo para obter algum tipo de vantagem ilícita para si ou para outrem, mas pune também aquele que se omite e não age em situações onde o bem público ou a integridade da Administração Pública se encontram em risco.

Ao longo deste artigo, traremos os principais pontos  da Lei 8.429/92 (LIA) que seguem vigentes.

Nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/21): o que mudou?

Sancionada em dezembro de 2021, a nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/21) impacta diretamente a conceituação e tipificação da improbidade administrativa. 

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Por meio da nova lei, mais de 20 artigos são modificados ou revogados. E muitos dos trechos que sofreram alterações, como é o caso do Art. 1º, por exemplo, versam justamente sobre a definição do ato ilícito. 

Vejamos, a seguir, algumas das principais alterações promovidas pela nova lei.

– Exclusão da forma culposa

Em linhas gerais, a principal modificação trazida pela lei é a necessidade da forma dolosa para que se caracterize a improbidade. Além disso, o dolo genérico perde espaço, e passa a ser preciso que se demonstre dolo específico. 

Na prática, significa que condutas culposas, como a imprudência, imperícia e negligência, deixam de ser consideradas improbidade. 

No que diz respeito ao dolo, ele se manifesta já na modificação do parágrafo primeiro do Art. 1, onde se lê:

§ 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais.      (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) [grifo nosso]

Da mesma forma, ao consultar os artigos 9, 10 e 11º da norma, onde se encontra descrição dos atos de improbidade, tem-se uma mudança de redação, para retirar a possibilidade culposa e priorizar o dolo. 

É, por exemplo, o caso do Art. 9, que passa  para a incluir a expressão “mediante a prática de atos dolosos”, como se vê, no trecho que segue:

Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei. [grifo nosso] 

– Necessidade de demonstração de perda real 

Ademais, agora, é preciso que se demonstre a perda real de patrimônio, e não apenas o dolo genérico e pressumido. 

Por conta disso, alguns atos previstos em lei tiveram sua redação modificada, para tornar esse aspecto claro. É o caso do inciso VII, do Art. 10, cuja redação final, dada pela nova lei de improbidade, é:

VIII – frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; [grifo nosso, no acréscimo trazido pela nova lei] 

– Mudanças no rito processual

A Lei de Improbidade Administrativa (LIA) sancionada em 1992 previa que a ação de improbidade administrativa, em seu rito ordinário, poderia ser proposta tanto pelo Ministério Público, quanto pela pessoa jurídica

Com a nova lei de improbidade (Lei 14.230/92), essa previsão é alterada, passando a dar exclusividade ao MP, conforme segue:

“Art. 17. A ação para a aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), salvo o disposto nesta Lei.

Por outro lado, a novíssima lei acrescenta uma espécie de “notificação” ao MP, nos seguintes termos:

“Art. 7º Se houver indícios de ato de improbidade, a autoridade que conhecer dos fatos representará ao Ministério Público competente, para as providências necessárias.

Além disso, o MP passa a ter exclusividade também na proposição de acordos. Enquanto, ao juiz, cabe converter sanções em multas, quando assim julgar necessário. 

Leia também:

Quais são os atos que caracterizam a improbidade administrativa?

A LIA apresenta, em seu texto, um rol de situações que caracterizam a improbidade administrativa. Algumas, no entanto, foram alteradas pela nova lei de improbidade administrativa (Lei 14.230/21). 

De modo geral, os atos de improbidade administrativa restaram divididos em três gêneros distintos. Cada gênero compreende uma seção do Capítulo II da lei. 

Assim sendo, abaixo, veremos alguns dos principais atos de improbidade previstos na legislação. Apontaremos ainda algumas das mudanças mais significativas trazidas na definição dos atos, a partir da Lei 14.230/21. 

– Enriquecimento ilícito

O primeiro rol de atos de improbidade administrativa é provavelmente o mais óbvio e comum no imaginário popular. A lei estabelece que é ilícito ao agente público enriquecer de forma ilícita por conta do seu cargo público, utilizando a Administração Pública como meio para o enriquecimento.

Como vimos anteriormente, o Art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa, modificado pela Lei 14.230/14,  traz que o enriquecimento ilícito  por meio da obtenção de vantagem patrimonal indevida em razão do cargo deve, necessariamente, ter ocorrido por meio de prática dolosa

Para além da definição trazida no caput, o Art. 9º traz ainda 12 incisos que descrevem as práticas ilícitas. 

Entre eles, podemos destacar: 

  • receber propina (em dinheiro ou bens) para facilitar ou praticar qualquer ato que seja de interesse de terceiros dentro da administração pública ;
  • receber propina ou aceitar promessa de vantagem econômica para tolerar a exploração ou prática de jogos de azar, lenocínio, de narcotráfico, contrabando, usurpa ou outras atividades ilícitas;
  • se utilizar, em benefício próprio, de quaisquer bens móveis, ou do trabalho do trabalho de servidores, empregados ou terceiros contratados pela administração pública,utilizar dos bens públicos para aumentar o patrimônio próprio.

Além disso, a nova lei de improbidade administrativa alterou a redação de alguns desses incisos, para determinar de maneira mais precisa as condutas criminosas. 

Por exemplo, no inciso VI, tem-se que o enriquecimento ilícito pode se dar pelo recebimento de vantagem econômica (propina) para “fazer declaração falsa sobre qualquer dado técnico que envolva obras públicas”. Antes, a declaração falsa era apenas sobre “medição e avaliação de obras públicas.”

Outro exemplo de mudança é no inciso VII, que passa a oferecer melhores condições de defesa ao agente público acusado, com a inclusão do trecho em negrito:

VII – adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução;

De modo geral, portanto, a parte de enriquecimento ilícito da Lei de Improbidade Administrativa ataca diretamente as diferentes formas de corrupção. 

A ênfase, no entanto, está na corrupção entre agentes públicos que recebem vantagens financeiras de terceiros interessados em subverter a Administração Pública para seus próprios interesses. 

– Prejuízo ao erário

Se a primeira classe de atos que são enquadrados na improbidade administrativa tinha como objetivo o enriquecimento ilícito do agente e de terceiros, a segunda parte tem como objetivo punir o agente público que causa prejuízo às finanças públicas.

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei. 

Entre os atos do agente público que prejudicam o tesouro público, estão:

  • facilitar que bens públicos vão para entes privados; 
  • facilitar a venda de bens públicos para entes interessados; 
  • realizar operações financeiras com capital público sem respeitar as devidas normas;
  • pagar despesas com dinheiro público não destinado para tal situação;
  • firmar contratos ou parcerias sem seguir as formalidades previstas em lei;

Dentre as principais mudanças trazidas pela nova lei, no que tange aos atos de improbidade que causam prejuízo ao erário, temos:

  • a inclusão dos atos de concessão, aplicação ou manutenção de benefício financeiro ou tributário indevido na seção de “prejuízo ao erário”:  antes estes atos estavam dispostos em seção própria;
  • a revogação dos incisos que tratavam de atos de neglicência: agir negligentemente na arrecadação de tributos e impostos ou na celebração e fiscalização de parcerias com entidades privadas deixa de ser crime, por exemplo. Incisos como o VIII, “ frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente”, também foram revogados.

Assim, os atos de improbidade administrativa diretamente relacionados ao prejuízo ao erário acabam por apresentar uma gama variada de condutas. Ao todo, a lei traz mais de 20 incisos para dar conta de prever todos os atos. 

Atentar contra os princípios da Administração Pública

O terceiro gênero de ato de improbidade é aquele que atenta contra os princípios da administração pública, os quais são rapidamente descritos no Art. 11, já com a nova redação:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade. 

Os atos especifícos previstos nos incisos da lei foram quase que integralmente acrescentados ou, ao menos, modificados pela nova lei de improbidade administrativa. 

De maneira geral, a nova lei revoga incisos que previam condutas demasiadamente genéricas ou culposas – como “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício” ou ainda “deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação.”. 

Por outro lado, instituiu 8 condutas que caracterizam atos de improbidade contra os princípios da administração pública. As principais são:

  • deixar de prestar contas, quando estas são responsabilidade do agente, para ocultar irregularidades;
  •  revelar, antes da respectiva divulgação oficial, o teor de medidas políticas ou econômicas capazes de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço;
  • revelar fato ou circunstância de quem tem conhecimento e que deveria permanecer em segredo (informação privilegiada ou que coloca em risco a segurança);
  • nomear cônjuge, companheiro ou parente (até o terceiro grau) da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão, cargo de confiança ou  função gratificada na administração pública direta ou indireta;
  • praticar, com recursos do erário, publicidade que contrarie o disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, para promover ou enaltecer o agente público, com a  personalização de atos, de programas, de obras, de serviços ou de campanhas dos órgãos públicos.

Mais uma vez, portanto, tem-se uma variedade de condutas abarcadas por uma mesma seção de atos. 

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Quem pode cometer atos de improbidade administrativa? Sujeitos da ação

Na improbidade administrativa, um dos sujeitos é o ativo: aquele que comete o ato ilícito. Pela redação dada a partir da nova lei de improbidade administrativa, podem ser enquadrados nesse ato os seguintes sujeitos:

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se agente público o agente político, o servidor público e todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no art. 1º desta Lei.        (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

Parágrafo único. No que se refere a recursos de origem pública, sujeita-se às sanções previstas nesta Lei o particular, pessoa física ou jurídica, que celebra com a administração pública convênio, contrato de repasse, contrato de gestão, termo de parceria, termo de cooperação ou ajuste administrativo equivalente.   

Importa ressaltar que a menção ao “agente político”, bem como, ao “servidor público”, no caput do artigo, são acréscimos promovidos pela Lei 14.230/21 (nova lei de improbidade). 

O mesmo se aplica ao parágrafo único do Art. 2, onde se menciona o agente particular. Na redação anteriormente vigente, não havia previsão expressa para a prática da improbidade por sujeito privado. 

Do outro lado, temos o sujeito passivo, aquele que é vítima, ou seja, sofre os danos da improbidade. 

De acordo com o inciso 5º do Art. 1º, tem-se os afetados pela improbidade administrativa:

§ 5º Os atos de improbidade violam a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções e a integridade do patrimônio público e social dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como da administração direta e indireta, no âmbito da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.  

Assim, a improbidade se dá nas esferas municipal, estadual e federal e abrange, inclusive, as autarquias. 

Além disso, cabe ressaltar que, como ocorre no sujeito ativo, também no passsivo é possível que sejam inclusas entidades privadas. Nos termos do inciso 6º do Art 1º, temos:

§ 7º Independentemente de integrar a administração indireta, estão sujeitos às sanções desta Lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade privada para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra no seu patrimônio ou receita atual, limitado o ressarcimento de prejuízos, nesse caso, à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.  

Quais são as punições aplicadas para improbidade administrativa?

Para além dos regramentos que caracterizam a improbidade administrativa, a Lei 8.429/92 também traz, em seu texto, as punições cabíveis para cada tipo diferente de ato desonroso que o agente público possa causar contra a Administração Pública.

De acordo com o Art 12, temos que as sanções previstas em lei podem se somar a outras penas aplicadas, em outras instâncias de julgamento. Conforme segue:

Art. 12. Independentemente do ressarcimento integral do dano patrimonial, se efetivo, e das sanções penais comuns e de responsabilidade, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato.

Nas próximas seções, veremos as penas previstas para cada tipo de improbidade. Contudo, cabe ressaltar, a nova lei de improbidade administrativa (Lei 14.230/21), promoveu uma série de alterações nesse regime de sanções.

De modo geral, as mudanças mais significativas estão relacionadas à suspensão dos direitos políticos e à perda da função pública. 

Pela nova lei, a perda de função se aplica estritamente ao vínculo que o agente detinha na ocasião da infração e só pode ser estendido a outros cargos por ordem do juiz (Art. 12, inciso 1º). 

Além disso, não há mais previsão de perda da função para os casos em que houver atentado contra os princípios da Administração Pública, apenas para as situações de enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário. 

Já no que diz respeito à suspensão dos direitos políticos, a nova lei aumentou o prazo máximo de suspensão – antes a previsão máxima era de 10 anos, agora pode chegar até os 14 anos. 

Por outro lado, a suspensão antes devia estar entre um prazo mínimo e máximo – 8 a 10 anos para enriquecimento ilícito, 5 a 8 anos para prejuízo ao erário. Agora, o juíz tem liberdade para determinar qualquer prazo de suspensão, desde que não supere os tetos de 14 e 12 anos, respectivamente. 

Além disso, no rol de mudanças trazidas pela nova lei temos que as sanções somente serão executadas após o trânsito em julgado da sentença condenatória. Assim, a suspensão dos direitos ou o afastamento da função, no caso dos agentes políticos com mandato eletivo, pode não chegar a tempo de produzir efeitos práticos. 

Por fim, da mesma forma que as ações são separadas, as punições são diferentes, de acordo com a ação cometida e com a finalidade que ela teve. É o que veremos a seguir. 

– Hipóteses de enriquecimento ilícito

O inciso I do artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa traz as seguintes punições para o agente público que utilizar de seu cargo para enriquecer de forma ilícita:

  • perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio;
  • perda da função pública;
  • suspensão dos direitos políticos até 14 (catorze) anos;
  • pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial;
  • proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente (por prazo não superior a 14 anos);

– Hipóteses de prejuízo ao erário

Para as hipóteses previstas no artigo 10 da lei, que trata do prejuízo ao erário, as punições são:

  • perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio (quando houver);
  • perda da função pública;
  • suspensão dos direitos políticos até 12 (doze) anos;
  • pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano;
  •  proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente (mesmo que por pessoa física da qual seja sócio), pelo prazo de até 12 anos. 

– Hipóteses de atentado contra a Administração Pública

Já quando o sujeito atenta contra os princípios da Administração Pública, de acordo com a previsão do Art. 11 da lei, tem-se as seguintes penalidades:

  • pagar multa civil de até 24 (vinte e quatro) vezes o valor da remuneração percebida pelo agente; 
  • proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de até 4 (quatro) anos;

Qual o prazo prescricional para a ação de improbidade administrativa?

Antes da aprovação da nova lei (Lei 14.230/21), a ação de improbidade administrativa possuía  prazos prescricionais que variavam de acordo com o cargo exercido. 

Com a reforma, no entanto, o Art. 23 da lei passou a conter uma única previsão de prazo prescricional, conforme segue:

Art. 23. A ação para a aplicação das sanções previstas nesta Lei prescreve em 8 (oito) anos, contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência.”


A nova redação da lei também dispõe sobre as condições de interrupção ou suspensão do prazo prescricional. São variadas as hipóteses, assim como os novos prazos. Confira, caso a caso, no corpo da lei.

Como a improbidade administrativa afeta a política no Brasil

A Lei de Improbidade Administrativa tem importância ímpar para o funcionamento saudável da Administração Pública, mas também tem um papel importante na política formal brasileira.

Por meio da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/10), pessoas que tiverem seus direitos políticos suspensos por conta de atos de improbidade administrativa não podem se tornar elegíveis, possibilitando assim que pessoas que tenham cometido atos desonrosos com a Administração Pública não possam voltar para o ofício público.

E, embora alguns juristas tenham avaliado que a nova redação do texto legal, dada pela Lei 14.230/21, tenha abrandado a aplicação das penas, é fato que o legislador demonstrou preocupação com a mitigação da improbidade por parte do Poder Público. 

É o que se vê, por exemplo, no Art. 23-A, onde se lê:

Art. 23-A. É dever do poder público oferecer contínua capacitação aos agentes públicos e políticos que atuem com prevenção ou repressão de atos de improbidade administrativa.

Irretroatividade da nova Lei de Improbidade Administrativa (LIA): o que diz o STF

Em agosto de 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou um Recurso Extraordinário de Agravo (ARE 843989) e, entre outros pontos, decidiu sobre a aplicação retroativa ou não da Lei 14.230/21. O julgamento recebeu especial atenção pública pelo seu potencial de afetar o futuro político de uma série de figuras que ocupam cargos eletivos no ano de 2022.

Ao final de quatro dias de julgamento, a corte decidiu pela irretroatividade da lei, exceto para os casos culposos abarcados pela lei de improbidade administrativa e que ainda não tenham transitado em julgado.

O STF também reforçou que o novo regime de prescrição, fundado no prazo de 8 anos a partir da ocorrência dos fatos, não tem aplicação retroativa.

Deste modo, a tese formada no STF contempla os seguintes pontos:

1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA – a presença do elemento subjetivo – DOLO;

2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;

3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente;

4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.

Papel do advogado nas ações de improbidade administrativa

Diferentemente do que ocorre em outros crimes de natureza penal, na improbidade administrativa – que é um ato ilícito de natureza civil – o advogado privado precisará lidar com sindicâncias e processos administrativos disciplinares (PADs). 

Assim, uma das principais preocupações do advogado que deseja atuar no âmbito do Direito Administrativo, em investigações de improbidade, deve ser a busca de conhecimento sobre as regras que norteiam essas instâncias de investigação, nos órgãos públicos. 

Outra frente de atuação importante é a consultiva. Advogados podem atuar na orientação de empresas privadas que firmam contratos e parcerias com entes públicos, a fim de mitigar o risco de improbidade. 

E, por fim, uma terceira esfera de atuação é aquela contenciosa, nas ações de improbidade que tramitam junto ao poder judiciário. Nestes casos, é fundamental que o profissional do Direito tenha domínio da lei, para que possa construir teses de defesa consistentes. 

Perguntas frequentes

O que é a Lei de Improbidade Administrativa?

A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), posteriormente alterada pela Lei 14.230/21, é o diploma legal que dispõe sobre as sanções a serem aplicadas frente à prática de atos de improbidade administrativa por agentes públicos ou políticos.

Quais são os atos de improbidade previstos na Lei de Improbidade Administrativa?

Os atos de improbidade administrativa se dividem em três esferas e compreendem uma série de ações. Os três grupos de atos de improbidade são:
– enriquecimento ilícito;
– prejuízo ao erário;
– atentar contra os princípios da Administração Pública.

Conclusão

A lei de improbidade administrativa é um marco significativo para o combate da corrupção sistemática entre o Poder Público e as entidades privadas, punindo o agente público que age de forma ímproba ao exercer a sua função dentro da Administração Pública.

Com o advento da nova lei, no entanto, definições e penalidades para a improbidade administrativa foram definitivamente alteradas. 

Por isso, é fundamental que os agentes do Direito – público, mas também privado – estejam cientes das alterações. Esperamos que este artigo tenha lhe ajudado nesta tarefa, e bom trabalho! 

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  1. Excelente material!!!
    Tinha muitas dúvidas que foram sanadas com este artigo.
    Tem algo semelhante sobre a Nova Lei de Licitações?

  2. Dr., Dessa forma, e considerando o
    Novo prazo prescricional, a Improbidade administrativa ocorrida em 2009, já prescreveu.
    Minha pergunta: Se constatado o crime contra erário, em qualquer tempo a União ainda pode exigir ressarcimento do servidor público que, contrariando o regime de trabalho(dedicação exclusiva), desempenhou atividade remunerada em outro órgão?

  3. Excelente! Linguagem simples e acessível, o que facilitou muito o entendimento da arquiteta e concurseira aqui! Já peguei o link para o conteúdo da nova lei de licitações. Obrigada pelo conteúdo!

  4. Um servidor público que emite um comunicado de justificativa de fechamento do posto de trabalho devido ao falecimento de colega de trabalho, sendo que não houve falecimento, pode ser enquadrado como ato de improbidade administrativa, essa atitude viola os princípios da moralidade e eficiência ??