Lei de Drogas: principais artigos e teses da Lei 11.343/06 atualizados e comentados

25/11/2022
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18/05/2023
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24 minutos

No início de 2022, o Canadá decidiu descriminalizar a posse de pequenas quantidades de drogas. No ano anterior, mais de 2 mil pessoas haviam morrido de overdose naquele país. Mas, você sabia que, no Brasil, também possuímos uma legislação específica para a questão das drogas? É a Lei 11.343/06, também chamada Lei de Drogas, Lei de Entorpecentes, ou Lei Antidrogas.

Essa legislação provocou muitas discussões, tanto entre juristas, quanto na sociedade civil. E, desde sua aprovação, já sofreu uma série de alterações.

Neste artigo, você verá os principais artigos da Lei de Drogas atualizados e comentados. Conhecerá, também, as principais mudanças e as decisões do STJ e STF, que interferiram na interpretação e aplicação da Lei 11.343/06. Confira!

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O que é a Lei de Drogas? (Lei 11.343/06)

A lei 11.343/06, também conhecida como Lei de Drogas é a principal legislação sobre o tema no país. Entre outros pontos, ela institui o Sistema Nacional de Políticas Pública sobre Drogas – Sisnad.

Trata-se de uma Lei Especial Penal, mas seu foco não está exclusivamente nas sanções para o uso ou tráfico de drogas. Como fica claro no artigo 1º, o texto da lei também se preocupa com aspectos como a prevenção e o reinserção de dependentes de drogas. Na letra da Lei:

Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes.

Antes de seguir com a análise da Lei de Drogas atualizada, é fundamental entender qual o conceito de “droga” trazido no texto legal. Inclusive, as legislações anteriormente vigentes, não utilizam o termo “drogas”, preferindo o uso de “substâncias entorpecentes“.

Já no princípio do texto da Lei 11.343/06, fica clara a nova nomenclatura jurídicopenal, portanto. É onde se encontra, também, o conceito de droga:

Art. 1º […]

Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.

E diferentemente do a legislação do Canadá, por exemplo, preconiza, aqui as drogas seguem criminalizadas. Isso está claro já no Art. 2º da Lei de Drogas:

Art. 2º Ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a hipótese de autorização legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a Convenção de Viena, das Nações Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas de uso estritamente ritualístico-religioso.

Parágrafo único. Pode a União autorizar o plantio, a cultura e a colheita dos vegetais referidos no caput deste artigo, exclusivamente para fins medicinais ou científicos, em local e prazo predeterminados, mediante fiscalização, respeitadas as ressalvas supramencionadas.

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– Crimes dolosos e culposos previstos na Lei de Drogas

De modo geral, a natureza da imensa maioria dos crimes previstos na Lei de Drogas (Lei 11.343/06) é dolosa. Na lista de crimes dolosos temos, portanto:

  • O uso ilegal ou posse de drogas, ainda que exclusivamente para uso pessoal;
  • Praticar o tráfigo de drogas (importar, exportar, transportar, preparar, vender, etc);
  • Semear, cultivar ou fazer a colheita de substâncias que serão matéria-prima para droga;
  • Induzir, auxiliar ou mesmo intigar alguém ao uso de drogas;
  • Oferecer drogas a pessoas de seu relacionamento, ainda que sem objetivo de lucro;
  • Associar-se com outros para o tráfico;

A lista é ainda maior, e veremos em detalhes, os crimes mais comuns, ao longo deste artigo. Por ora, é importante saber que essa legislação também traz ao menos uma previsão de crime culposo, conforme segue:

Art. 38. Prescrever ou ministrar, culposamente, drogas, sem que delas necessite o paciente, ou fazê-lo em doses excessivas ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Assim, constituí crime culposo, pela Lei de Drogas:

  • Prescrever drogas, culposamente, sem necessidade, em dose excessiva, ou desacordo com a lei (crime materializado pela prescrição de receita, por parte de médicos ou dentistas);
  • Ministrar, culposamente, drogas nas mesmas condições acima (crime materializado pela aplicação da droga, inclusive por enfermeiros ou farmacêuticos).

Quais os principais artigos da Lei 11.343/06?

Anteriormente à Lei de Drogas ou Lei de Entorpecentes, o que se tinha no ordenamento jurídico eram as leis Lei n. 6.368/76 e 10.409/02.

Na prática, o texto aprovado em 2006 provocou uma série de alterações na legislação até então vigente. Desde a concepção do que são drogas, o que caracteriza crime e, passando, até mesmo, pelas penalidades.

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Por conta disso, a seguir, selecionamos e comentamos alguns dos principais artigos da Lei de Drogas. Vamos lá?

– Art. 28 da Lei 11.343/06: do uso de drogas

O artigo 28 da Lei de Drogas é um dos que mais discussões gerou, uma vez que ele trata do uso de drogas – diferente do tráfego. O uso de drogas é caracterizado por algumas ações, como a compra e o transporte, sempre com a finalidade de consumo pessoal. E, pelas suas penas, resta claro que se trata de contravenção penal, e não de crime propriamente. Na letra da lei:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;
II – prestação de serviços à comunidade;
III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo

Alguns aspectos sobressaem, na análise desse artigo. Primeiro, tem-se a questão do fato atípico. O texto da lei deixar claro que as ações relacionadas às drogas (adquirir, guardar, etc) tem sua tipicidade diretamente associada às expressões “sem autorização” e “em desacordo com a determinação legal”.

Logo, se o indíviduo dispõe de autorização legal para fazê-lo, tem-se um fato atípico – ou seja, não se materializa a conduta criminosa.

Sobre procedimentos e competências, a professora explica:

A conduta prevista no art.28 da Lei 11.343/06 é de competência dos Juizados Especiais Criminais, incumbindo ao Ministério Público, quando do oferecimento da proposta de transação penal, indicar a pena ou penas que deverão ser impostas ao usuário. Diferentemente do que ocorria na disciplina anterior, sob a dicção da lei 6368/76, na ocorrência de descumprimento da transação, o ministério público não oferecerá denúncia pelo porte, podendo, o juiz, realizar nova censura verbal ou aplicar o pagamento de uma multa. É possível, também, que o usuário obtenha nova proposta de transação penal, ainda que já beneficiado há menos de 05(cinco) anos.

Discussões acerca do art. 28 da Lei de Drogas.

Há duas grandes discussões que mobilizaram juristas e cortes superiores, nos anos recentes, no que tange ao artigo 28 da Lei 11.343/06. Uma delas coloca, dde um lado, o princípio da alteridade, e de outro, a proteção da saúde pública.

Certa corrente de juristas advoga no sentido de que o art. 28 torna crime uma conduta que atinge e impacta exclusivamente o agente que a pratica – eis aí o princípio da alteridade.

Por outro prisma, estão os juristas que sustentam que o objetivo último da lei não é proibir condutas relacionadas ao consumo pessoal de droga. Mas, sim, reduzir a circulação das mesmas entre a população. Neste sentido, o art. 28 contribuiria para reduzir riscos relacionadas à saúde pública.

A outra discussão diz respeito a determinação do que caracteriza o porte para consumo pessoal. A própria Lei de Drogas traz a seguinte determinação:

Art. 28 […] § 2º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

A ausência de definição mais precisa levou a dezenas de pedidos de desclassificação (suplantação do enquadramento por tráfico, pelo de porte para consumo pessoal). Ao fim e ao cabo, o STJ que mesmo uma ínfima quantidade de droga não pode ser descaracterizadora de tipicidade:

A quantidade ínfima da droga não desnatura o ilícito, o crime de uso de entorpecente é contra a saúde publica e a porção mínima utilizada pelo agente é irrelevante para a configuração do delito. STJ – JSTJ 68/384

– Art. 33 da Lei 11.343/06: do tráfico de drogas

No artigo 33 da Lei de Drogas, encontra-se tipificado o crime popularmente conhecido como tráfico de drogas. Atente-se para o fato de que são 18 os verbos utilizados para caracterizar essa conduta criminosa. Conforme segue:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar:

Pena – Reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa (Brasil, 2006a).

A redação que estava vigente até então, dada pela Lei 6.368/76 enumerava uma quantidade de verbos bastante similar. O professor Alberto Bezerra alerta, apenas, que o texto anterior continha a expressão “entregar, de qualquer forma” – que foi suplantada na nova Lei de Drogas.

Outro ponto que merece destaque no artigo 33 é o incremento da pena mínima, em relação a lei anteriormente vigente. No texto da Lei 6.368/76 o mínimo eram 3 anos de reclusão. Na legislação vigente (Lei 11.343/06), são cinco anos. Ao longo deste artigo, abordaremos as penas e sanções e previstas, em detalhe.

– Art. 34 da Lei 11.343/06: da posse de equipamentos

Uma das novidades trazidas pela Lei de Drogas está no que diz respeito a posse ou guarda de equipamentos que podem ser utilizados para fabricação ou preparação de drogas. In verbis:

Art. 34. Fabricar, adquirir, utilizar, transportar, oferecer, vender, distribuir, entregar a qualquer título, possuir, guardar ou fornecer, ainda que gratuitamente, maquinário, aparelho, instrumento ou qualquer objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. […]

O texto da lei menciona maquinários, aparelhos ou instrumentos. Contudo, cabe destacar, já há jurisprudência sobre o art. 34, firmando que a periculosidade da posse, guarda ou fornecimento desses itens precisa ser relacionada ao tráfico de drogas. Vejamos o que traz a ementa do Recurso em Habeas Corpus Nº 135.617/PR:

3. […] para que se configure a lesão ao bem jurídico tutelado (saúde pública), a ação de possuir maquinário e/ou objetos deve ter o especial fim de fabricar, preparar, produzir ou transformar drogas, visando o tráfico.

4. Portanto, ainda que o crime previsto no art. 34 da Lei n. 11.343/2006 possa subsistir de forma autônoma, não é possível que o agente responda pela prática do referido delito quando a posse dos instrumentos se configura como ato preparatório destinado ao consumo pessoal de entorpecente.

– Art. 35 da Lei 11.343/06: da associação para o tráfego

Outra importante contribuição da Lei de Drogas encontra-se no art. 35, que trata da associação para o tráfego. Na letra da lei:

Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 desta Lei […].

No mundo jurídico, o artigo 35 da Lei 11.343/06 acabou por suscitar uma série de discussões, para que se determine o que a final caracteriza a associação para o tráfico. Recentemente, decisão no HC 610.483 entendeu, por exemplo, que a venda de drogas em grupo, por si só, não define a associação.

Por outro prisma, está firmada também a tese de que não há necessidade de encontrar drogas em posse do agente para que se materialize a associação para o tráfico.

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Quais são as penas previstas na Lei de Tráfico de Drogas?

Com a vigência da Lei de Drogas, (Lei 11.343), a partir de 2006, muitas penas anteriormente previstas para crimes relacionados ao tráfico de entorpecentes, ao uso de drogas, entre outros, sofreram alterações.

Atualmente, portanto, temos as seguintes penas previstas na Lei de Drogas:

Uso de drogas (consumo pessoal)Advertência sobre os efeitos das drogas; prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.Art. 28 da Lei 11.343/06
Tráfico de drogas Reclusão de 5 a 15 anos e pagamento de 500 a1.500 dias-multa.Art. 33, caput, da Lei 11.343/06
Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de drogaDetenção, de 1 a 3 anos, e multa de 100 a 300 dias-multa.Art. 33, § 2º
Oferecer droga, sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumiremDetenção, de 6 meses a 1 ano, e pagamento de 700 a 1.500 dias-multaArt. 33, § 3º 
Manter maquinário, aparelho, instrumento ou objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogasReclusão, de 3 a 10 anos, e pagamento de 1.200 a 2.000 dias-multa.Art. 34
Associação para o tráfico Reclusão, de 3 a 10 anos, e pagamento de 700 a 1.200 dias-multa.Art. 35
Financiar a prática dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 desta LeiReclusão, de 8 a 20 anos, e pagamento de 1.500 a 4.000 dias-multa.Art. 36
Colaborar, como informante, com organizações do tráfico (envolvidas nos crimes dos arts. 33 e 34)Reclusão, de 2 a 6 anos, e pagamento de 300 a 700 dias-multa.Art. 37
Prescrever ou ministrar, de modo culposo, drogas sem necessidade, em doses excessivas ou em desacordo com a leiDetenção, de 6 meses a 2 anos, e pagamento de 50 a 200 dias-multa.Art. 38
Conduzir embarcação ou aeronave após o consumo de drogasDetenção, de 6 meses a 3 anos, além da apreensão do veículo, cassação da habilitação ou proibição de obtê-la, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada, e pagamento de 200 a 400 dias-multa.Art. 39

Vale lembrar que, em relação ao texto anteriormente vigente (Lei 6.368/76), a lei de tráfico de drogas aprovada em 2006 aumentou algumas penas, enquanto reduziu outras.

Notavelmente, houve a redução em relação ao uso de drogas (consumo pessoal), que antes era punido até mesmo com reclusão. Por outro lado, a pena mínima para condutas de tráfico era de 3 anos. Agora, é de 5 anos de reclusão.

– Art. 40 da Lei de Drogas: majoração da pena

O artigo 40 da Lei 11.343/06 prevê pelo menos 7 fatores que podem contribuir na majoração das penas relacionadas à entorpecentes. Vejamos:

Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:

I – a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito;
II – o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;
III – a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;
IV – o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva;
V – caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;
VI – sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação;
VII – o agente financiar ou custear a prática do crime.

– Art. 42 da Lei de Drogas: preponderância de fatores

No que tange as penas e sanções, cabe ainda destacar o artigo 42 da Lei de Drogas, que prevê a prevalência de alguns fatores previstos no texto dessa Lei, sobre aquilo que dispõe o Código Penal, em seu Art. 59.

Assim, temos, na Lei 11. 343/06:

Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.

O que mudou com a nova Lei de Drogas?

Além das mudanças feitas pela lei de drogas em 2006, alterando os textos que a ela precedem, ela própria passou por alterações após sua publicação.

– Lei 13.840/19 e a internação voluntária

Em 2019, a lei 13.840 alterou a lei 11.343 em relação aos seguintes assuntos:

  1. Medidas para internação de usuários
  2. Mudança das penas condenadas por tráfico
  3. Privilégio de linha de financiamento direto de comunidades terapêuticas.

Sobre o primeiro aspecto, a lei dispõe:

Art. 23-A. O tratamento do usuário ou dependente de drogas deverá ser ordenado em uma rede de atenção à saúde, com prioridade para as modalidades de tratamento ambulatorial, incluindo excepcionalmente formas de internação em unidades de saúde e hospitais gerais nos termos de normas dispostas pela União e articuladas com os serviços de assistência social e em etapas que permitam[…]

Já sobre o segundo tópico, o novo regramento aumenta a pena por tráfico de drogas de 4 para 6 anos. E sobre o último, a lei dispõe sobre a responsabilidade de financiamento às casas de tratamento, bem como, quem fiscalizará este repasse e a atuação das entidades.

– Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime) e o conceito de agente disfarçado

Ademais, a lei de drogas também sofreu alterações após a divulgação da lei Nº 13.964, também conhecida como pacote anticrime. Esta lei, dispõe sobre a penalidade em caso de uso de drogas, que deixa de ser a privação, e passa a ser medidas de advertência sobre os efeitos da droga e serviços à comunidade.

– Lei 14.322/22: o que dizem os artigos 60 e 61?

Em abril de 2022, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei 14.322/22 que altera os artigos 60 e 61 da lei de drogas.

A alteração diz respeito à apreensão de veículos utilizados para o transporte de mercadorias ilícitas.

No art. 60º a nova lei dispõe:

Art. 60. ………………………………………………………………………….

…………………………………………………………………………………………………

§ 5º Decretadas quaisquer das medidas previstas no caput deste artigo, o juiz facultará ao acusado que, no prazo de 5 (cinco) dias, apresente provas, ou requeira a produção delas, acerca da origem lícita do bem ou do valor objeto da decisão, exceto no caso de veículo apreendido em transporte de droga ilícita.

§ 6º Provada a origem lícita do bem ou do valor, o juiz decidirá por sua liberação, exceto no caso de veículo apreendido em transporte de droga ilícita, cuja destinação observará o disposto nos arts. 61 e 62 desta Lei, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé.” (NR)

Já no art. 61º o mesmo regramento dispõe:

Art. 61. A apreensão de veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte e dos maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de qualquer natureza utilizados para a prática, habitual ou não, dos crimes definidos nesta Lei será imediatamente comunicada pela autoridade de polícia judiciária responsável pela investigação ao juízo competente.

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Principais resoluções do STF e STJ sobre a Lei de Drogas

A Lei de Drogas é considerada, por muitos juristas, um caso exemplar de “norma penal em branco”. Ocorre que o texto da lei deixa margem para uma série de interpretações, o que tem levado às cortes supremas a arbitrarem muitas questões.

Passados mais de 15 anos de sua aprovação, há um grande número de teses já consolidadas no Superior Tribunal de Justiça, e no Supremo Tribunal Federal. Vejamos, a seguir, algumas delas.

– Multa prevista no Art. 33, para tráfico de trogas, é constitucional

Como vimos, agentes enquadrados nas condutas criminosas do Art. 33 da Lei de Drogas – que trata do tráfico – podem ser obrigados a pagar de 500 até 1.500 dias-multa. Em muitas decisões, no entanto, juízes vinham aplicando multas inferiores ao mínimo estabelecido nesse artigo.

Contudo, no final de 2021, o STF entendeu que a previsão legal encontra amparo na Constituição Federal. E, a partir desse entendimento, fixou a seguinte tese de repercussão geral:

“A multa mínima prevista no artigo 33 da Lei 11.343/2006 é opção legislativa legítima para a quantificação da pena, não cabendo ao Poder Judiciário alterá-la com fundamento nos princípios da proporcionalidade, da isonomia e da individualização da pena”

– Atuação como “mula” afasta a aplicação dos minorantes do Art. 33, § 4º

Na linguagem corrente em regiões afetadas pelo tráfico de drogas, “mula” é o nome dado a pessoa que faz o transporte de drogas, sobretudo em áreas policiadas. Quem atua como “mula” pode fazê-lo em troca de pagamento, ou por coação.

No art. 33, § 4º, da Lei de Drogas. temos minorantes para a pena de tráfico de drogas, nos seguintes termos:

§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, […], desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.     

Contudo, a jurisprudência consolidada nas cortes entende que esse parágrafo não se aplica para a redução de penas dos chamados “mulas”. Como firmado na ementa do AgRg no AREsp 303213:

A condenação pelo delito previsto no art. 35 da Lei n. 11.343/06 demonstra a dedicação do acusado a atividades ilícitas e à participação em organização criminosa, elementos suficientes para afastar a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da supracitada lei. Ademais, conclusão em sentido contrário, quanto à dedicação ou não do agravante à prática de atividades criminosas como meio habitual de vida, demanda incursão no material fático-probatório dos autos, providência obstada em recurso especial (Súmula 7/STJ). AgRg no AREsp 303213

– Princípio da insignificância não se aplica aos art. 28 e 33 da Lei de Drogas

No julgamento de um Habeas Corpus (HC 122682), o STJ decidiu que o princípio da insignificância não se aplica ao crime de tráfico de Drogas (art. 33), tampouco à contravenção de porte de drogas para consumo próprio (art. 28 da Lei de Drogas). As cortes tem entendido que os crimes envolvendo drogas e entorpecentes são do tipo presumido, o que afastaria a aplicaçao desse princípio.

Como bem listou o compilado de Jurisprudências em Tese nº 131, do STJ, são inúmeras as decisões que reafirmam esse entendimento:

O princípio da insignificância não se aplica aos delitos do art. 33, caput, e do art. 28 da Lei
de Drogas, pois tratam-se de crimes de perigo abstrato ou presumido. Julgados: HC 461377/PR, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 22/11/2018; EDcl no HC 463656/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 04/10/2018, DJe 24/10/2018; AgRg no HC 387874/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 10/08/2017; HC 386093/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 20/04/2017, DJe 27/04/2017; HC 377737/MS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 16/02/2017, DJe 16/03/2017; AgRg no REsp 1578209/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 27/06/2016. (Vide Informativo de Jurisprudência N. 456) (Vide Jurisprudência em Teses N. 45 – TESE 3) (Vide Legislação Aplicada: LEI 11.343/2006 – Art. 28 e Art. 33, caput) (Vide Repercussão Geral – TEMA 506)

Leia também:

– Condenação pelo art. 28 da Lei de Drogas não enseja reincidência

Em março de 2022, durante julgamento de Agravo Regimental no Recurso Ordinário de Habeas Corpus (RHC 178512), a segunda turma do STF decidiu que a existência de condenação anterior, pelo porte de drogas para consumo pessoal (Art.28 da Lei de Drogas) não configura motivo hábil para ensejar a reincidência.

Entre outros pontos, o acórdão destacou que:

3. Não se afigura razoável permitir que uma conduta que possui vedação legal quanto à imposição de prisão, a fim de evitar a estigmatização do usuário de drogas, possa dar azo à posterior configuração de reincidência.

4. Além de aparente contrariedade com a própria teleologia da Lei 11.343/2006, no que diz respeito à forma de tratamento que deve ser conferida ao usuário de drogas, deve-se ponderar ainda que a reincidência depende, segundo consolidada jurisprudência desta Corte, da constatação de que houve condenação criminal com trânsito em julgado, o que, em grande parte dos casos de incidência do art. 28 da Lei 11.343/2006 não ocorre.

O acórdão deixou claro ainda que a Lei de Drogas objetiva um tratamento não estigmatizante ao usuário de drogas, o que não se confirmaria se fosse considerada válida a possibilidade de reincidência, a partir de uma contravenção, como o porte de drogas para consumo próprio.

Legalização de drogas no Brasil

Como visto, então, no Brasil, a legislação não aponta para uma possível liberação do uso de drogas, tal como feito no Canadá. Mas, a legislação já apresenta uma redução da pena e a permissão, em alguns casos, para o uso medicinal. Entretanto, a defesa da liberação, especialmente da maconha, é um conceito defendido por muitas pessoas. Inclusive, existe até mesmo grupos que promovem atos políticos relacionados a isso, como, por exemplo, a marcha da maconha.

Recentemente, a equipe da Projuris fez um debate no JurisCast sobre a legalização da maconha. Confira:

Perguntas frequentes

Qual é a nova lei de Drogas

A Lei 14.322 de 2022 é a nova lei de drogas que dispõe sobre o uso de veículos apreendidos que estavam sendo utilizados para o tráfico de drogas. Anteriormente a esta lei, o veículo podia ser devolvido, mesmo que (apreendido) em atividade ilícita. Com a nova regra, os veículos permanecem apreendidos.

O que diz a lei sobre o uso de drogas?

A Lei 11.343 de 2006 considera os atos de adquirir, guardar, transportar ou cultivar drogas para uso pessoal como crime, cujas penas podem ser advertência, prestação de serviços à comunidade e medidas educativas ou de tratamento. Além disso, esta mesma lei prevê que, para determinar se a droga é de uso pessoal ou não, o juiz deverá observar quantidade, local e condições da apreensão. Isso porque, o uso de drogas é um crime de conduta menor.

Qual a pena para lei de drogas?

Se acaso o crime cometido for o de uso, a penalidade é menor, podendo ser advertência, prestação de serviços à comunidade e medidas educativas ou de tratamento. Já se o crime for o tráfico de drogas, a penalidade é de 5 a 15 anos de reclusão mais 500 a 1.500 dias multa.

Conclusão

Como você viu, a Lei de Drogas (Lei 11.343/06) é uma das mais importantes Leis Penais Especiais em vigência no Brasil. As muitas alterações realizadas no texto original, associadas às muitas teses e jurisprudências firmadas nas cortes superiores, tornam essa uma das leis mais desafiadoras para advogados que atual no ramo do Direito Penal.

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